segunda-feira, 19 de março de 2012

Sobre os Estaduais


Sobre os Estaduais



(Rafael Castelo Branco)

Os Campeonatos Estaduais, do jeito que estão, estão em sua fase minguante. Ou encontra-se uma fórmula de torná-los interessantes ao grande público, ou eles começarão a perder valor econômico pelo desinteresse geral e queda de audiência (de público ele já mostra uma queda constante nos últimos anos). As federações estaduais, que veem futebol como a CBF via na década de 70 - quando montava-se nacionais com mais de 50 clubes apenas pra agradar a ditadura, acreditam que está tudo bem. Pior, no ano passado o presidente da Federação Paulista considerou o Paulistinha um sucesso, que só não foi maior devido a, pasmem, o PEQUENO número de datas. Se depender deste tipo de dirigente, os estaduais chegarão no ponto do nacional de 87, quando a CBF não tinha mais como dirigi-lo e, não fosse a união dos clubes para salvá-lo, ali se encerraria o Campeonato Brasileiro. Mas quem terá interesse em salvar os estaduais? Ainda mais para que as feudais federações continuem em sua politicagem que nada tem a ver com o planejamento e bem estar do futebol brasileiro.


Há uma solução. Que deveria ter sido tomada há tempos, mas nunca houve um momento tão propício politicamente para fazê-lo. A mudança de poder na CBF permite que isso aconteça. Basta que os clubes grandes assim queiram.


Vamos a ela. Passa, claro, por enxugar o número de datas. Como fazer isso sem exterminar os pequenos? Ora, não é nenhum bicho de sete cabeças. Mas primeiro, por que seria interessante pros grandes salvar este campeonato ao invés de deixá-lo morrer? Pra ser sucinto, dois motivos: o clube grande é grande porque existem os médios e pequenos. Há que se ter comparação. Ao acabar simplesmente com os estaduais, acaba-se praticamente com os pequenos. Mesmo que haja estaduais apenas para os pequenos, se eles ficam sem chance de buscar seu lugar ao sol, se os jogadores não tem a chance de despontar para o clube grande pela distância enorme que se cria do "interior" preo "grande centro", parte dos pequenos morre. Estão morrendo agora, há que se dizer, mesmo com estaduais. Mas morrerão também sem eles. O fim dos pequenos acaba com o fator de comparação, e acaba também com uma parte importante do celeiro de jogadores. Não só das escolinhas de base dos grandes clubes saem os grandes jogadores. Eles também saem da base dos pequenos. Sem estes, teremos muitos jogadores que nunca se tornarão profissionais (e alguns bons ou ótimos profissionais), o que empobrece o futebol nacional de forma geral. Assim, com o fim dos estaduais, há uma nova divisão de clubes, pois os pequenos desaparecem, os médios se tornam os novos pequenos e alguns grandes se tornam médios, diminuindo inclusive o número de grandes clubes no Brasil. Algo que a própria divisão de cotas já trabalha a favor.


A solução, então, é que os pequenos tenham calendário e possam enfrentar os grandes, mantendo-se assim o interesse pela competição. Esta seria o estadual. Para que isso seja possível, faz-se uma fase pré-estadual. Regionalizada, com grandes confrontos valorizando a rivalidade local e criando um torneio de interesse pros torcedores e clubes pequenos. Além, claro, de um calendário para boa parte do ano. Este seria completado com as "Copas estaduais", torneios nos moldes mata-mata que completariam os calendários dos pequenos. Os primeiros colocados dos pré-estaduais (torneios que poderiam ter nomes próprios, claro. No Rio, por exemplo, poderia ser a "Taça Guanabara", quem sabe?) se juntariam aos clubes pré-qualificados e estes jogariam o estadual. Quais os clubes pré-qualificados? Os clubes pré-qualificados seriam os que, no ano anterior, jogaram alguma divisão nacional. Assim, clubes que jogaram as Séries A, B, C e D aguardariam os clubes qualificados pelo torneio eliminatório. Vamos excetuar São Paulo, por ora. Todos os campeonatos poderiam ter 12 clubes, divididos em 4 grupos com 3 participantes cada. Todos os clubes enfrentarão apenas os clubes de seu próprio grupo. Ou seja, 2 outros clubes. Em ida e volta. 4 jogos, 6 datas. Após isso, os primeiros colocados de cada grupo se enfrentam em ida e volta em semifinal e final. Mais 4 jogos, 4 datas, totalizando no final 10 datas, sendo 8 jogos. Esse efeito de tiro curto daria mais emoção, permitindo aos pequenos uma chance real de ganharem o título. Essa imprevisibilidade certamente daria emoção ao torneio. Além disso, imaginemos novamente o Campeonato Carioca. O Flamengo teria em seu grupo, por exemplo, Bangu e Madureira. Após dois jogos contra Bangu e Madureira, se terminasse em primeiro, após apenas 3 semanas (por exemplo, da primeira a terceira semana de Fevereiro, dependendo das datas de meio de semana da Copa do Brasil ou Libertadores, qe poderiam ser realizadas nas duas datas em que o clube não atua no estadual, devido ao confronto Madureira x Bangu), já enfrentaria, por exemplo, o Fluminense, que batera Olaria e Macaé na fase de grupos. O FlaxFlu já valeria fase pra final do estadual. E uma semana depois, já teríamos o confronto, digamos, entre Flamengo e Botafogo (ou Vasco x Fluminense) pela final do estadual. 4 jogos menores e 4 jogos grandes. Quase todos de caráter decisivo. Sem uma fase morosa e jogos sem valer nada.


Pro caso de São Paulo, único, é um pouco mais complicado. Simplesmente porque o estado possui hoje, por exemplo, 16 clubes disputando as diversas divisões nacionais. Minha solução seria, neste caso, a seguinte. 8 grupos, com 5 clubes em cada grupo. Assim, o "Paulistão" teria QUARENTA CLUBES! Mas a fórmula seria muito parecida com a dos demais estaduais. A fase de grupos teria jogos apenas de ida. Com isso, dariam 4 jogos pra cada clube, em 5 datas, uma data de folga pra cada clube. O primeiro colocado passaria pras quartas de finais. Assim, teríamos quartas, semifinais e finais. 10 jogos, 11 datas. Dois jogos a mais do que os demais estaduais, uma data a mais. Este encurtamento dos estaduais permitiria uma pré-temporada de um mês em janeiro, além de uma inter temporada em junho/julho, que de 4 em 4 anos colidiria com as datas da Copa do Mundo (e em outros anos serviria de datas livres pros clubes recuperarem jogadores e/ou fazerem excursões). E não precisaríamos ter jogos durante as datas FIFA.


Outra idéia pra fortalecer outros centros do futebol seria voltarmos de certa forma com a Copa Norte-Nordeste, tendo ela apenas fase de mata-mata e acontecendo nas datas reservadas a Copa Sul Americana. A classificação pro torneio se daria pelos estaduais e os clubes que por ventura jogassem a Copa Sul Americana abririam mão de jogar a competição, cedendo a vaga a outro clube do mesmo estado. Mas aí é outra conversa. Apenas para ilustrar, a Copa Sul Americana no ano passado teve 10 datas para os clubes brasileiros. Em 10 datas, em um torneio apenas com fase "mata-mata", poderíamos ter 32 clubes ao total, com a fase de dezesseis avos de final, oitavas, quartas, semi e finais. 10 datas com os 32 maiores clubes dos 16 estados das regiões Norte-Nordeste se enfrentando apenas em jogos decisivos.


Este formato de calendário aumenta o interesse do nosso produto, ao meu ver. Teremos estaduais de tiro curto, com jogos decisivos e mantendo uma tradição local, fortalecendo a base do futebol, sem torneios cansativos e longos aos olhos contemporâneos. As datas do futebol internacional seriam melhor aproveitadas pelos clubes do Norte-Nordeste. As datas FIFA não atrapalhariam o futebol nacional, assim como a parada pra Copa não faria com que tivéssemos maratonas de jogos para compensá-la, já que já teríamos um calendário que estaria preparado para ela.


Enfim... Falta é boa vontade. E acabar com o poder dos senhores feudais das federações estaduais, que asfixiam os grandes e matam os pequenos ao fazerem o pior pro futebol.


(19 de março de 2012)

sexta-feira, 16 de março de 2012

Cenário Local

A torcida do Galo tem sido bipolar na última década, certamente. Os torcedores do Galo que viveram os desastres dos últimos 10 anos sem terem visto boas campanhas e times que brigavam na parte de cima guardam certa mágoa e ressentimento do clube de uma forma diferente dos outros, que hoje me parecem mais sedados pela nostalgia do que neste vício bipolar da parte mais jovem. É compreensível.

Mas será que este efeito é simplesmente pelo Galo estar mal? Ou será que pelo Cruzeiro estar muito bem nesta última década? Aliás, o Cruzeiro está de fato tão bem assim na última década?

Galo e Cruzeiro vivem uma forma de rivalidade parecida com a que acontece entre Grêmio e Inter. Como são dois clubes grandes no estado, e apenas dois, o termo de comparação é restrito. Assim, se um dos dois vai mal, é em comparação ao outro. E isso vale também pra saber se um vai bem. No Rio Grande do Sul se fala muito em uma gangorra que quando um está mal o outro está bem. Isso se deve mais, na minha opinião, a este fator de comparação que a uma análise fria de resultados. E assim é em Minas.

Volto ao começo do texto, para que não nos percamos. A torcida do Galo era conhecida por apoiar sempre. Já até foi apelidada de "a mais argentina das torcidas". Hoje é comum ler e ouvir que assim não mais é porque a torcida "acordou" e que o "apoio incondicional" não leva a lugar algum. E pra apoiar este argumento, se desfaz do que foi o futebol nas décadas antes da atual fase mercantil do esporte. O futebol de profissionalizou ali pelos anos 30, durante o surgimento da FBF e da possibilidade de se pagar os jogadores, o que na época rachou o futebol nacional em dois grupos: os que denfendiam a permanência do amadorismo e os que insistiam em profissionalizá-lo. Sem tanto racha, o futebol brasileiro começou a se mercantilizar em 1987, com a Copa União. A partir dali, o cenário nacional passou a ter um peso muito maior do que já tinha. E aos poucos o cenário internacional foi se tornando tão importante quanto, ao ponto de hoje ser considerado mais importante que o nacional. E tudo em detrimento do cenário doméstico. O que não era assim até essa mercantilização. Essa torcida que só acompanhou este futebol de mercado é quem acredita que o tal "apoio incondicional" nunca levou o Galo "a lugar algum". Em detrimento aos tantos estaduais, que durante 50 anos foram os principais títulos disputados e por pelo menos mais 30 tão importantes quanto os demais. Assim, essa torcida cobra títulos de grande porte. O que de fato é importante. Mas que não é a causa nem da intransigência aparente da mesma torcida, nem da gangorra do futebol mineiro ter pendido por alguns dos últimos anos pro lado do Cruzeiro.

"Evoluímos". Vemos o futebol de caráter nacional. Mas tanto aqui, quanto em Porto Alegre, o que vale é o cenário local, em primeira instância. É nesta arena que o Galo vai mal. E é esta a causa de tanto sofrimento da torcida, que a tornou, como disse o próprio presidente, chata. Ainda prefiro o termo bipolar. Capaz de se empolgar com pequenas coisas e de voltar a depressão por quase nada. Mas, se o presidente diz chata, que seja chata.

O cenário local é basicamente sustentado por três pilares: clássicos, estaduais e campanhas nos demais campeonatos. Mas o que de fato isso significa?

Os clássicos são simples de se entender. Quem ganha mais, quem faz mais gols, quem causa ao adversário maior sofrimento... Desde o último campeonato mineiro em que o Atlético bateu o Cruzeiro em uma final, certamente este pilar é completamente cruzeirense.

Os estaduais podem não "valer nada", mas são capazes de derrubar treinadores e gerar crises no clube que vai mal. Por que? Pelo poder no cenário doméstico. É a comparação com o rival que faz esse estrago. Ganhar a maioria dos estaduais pode não significar que se vai bem, mas certamente piora muito as coisas pra quem os perde. Aqui, novamente, o Galo vai mal perante seu rival.

E "as campanhas nos demais campeonatos"? Significa o que? Exatamente isso. Em termos domésticos, quem vai melhor nos outros campeonatos. Em 2011, pela primeira vez nos pontos corridos, o Atlético foi melhor que o Cruzeiro. Mas a última partida (um clássico), fez isso perder a sua importância.

É aqui, nesta arena local, nestes três pilares, que o Galo tem perdido sua força maior: a torcida. A torcida do Galo não está, como pensa, cobrando pela falta de títulos. Está cobrando os títulos pra compensar o fracasso em sua rivalidade doméstica. E os títulos de grande expressão seriam sim muito bem vindos. Mas se o Galo quer voltar a ter mais torcida na faixa jovem da população que seu rival, isso passa por derrubar a soberania azul nestes pontos chaves. E os títulos maiores farão seu efeito acelerador nesta mudança.